A discursiva que coloca como elemento central a procriação para legitimar a família patriarcal, cisgênero e heterossexual remonta os primórdios e não serve como fundamento moral justificável em Repúblicas democráticas. A procriação não deve ser o elemento fundamental para a formação de uma entidade familiar, tanto a legislação como a jurisprudência entendem que o afeto é o elemento aglutinador do núcleo familiar. Diante das diversas formas de se constituir a família, esse argumento moral já perdeu força e importância, tanto do ponto de vista social como jurídico.
Com o advento das reivindicações das emergentes práticas sociais, consagrando como entidade familiar relações que outrora viviam no limbo do ordenamento jurídico, como é o caso das famílias recompostas, monoparental, a socioafetiva, a homoafetiva, entre outras. A parentalidade e a filiação, dois consagrados institutos jurídicos, possuem proteção constitucional com base no princípio da afetividade das relações familiares.
O projeto familiar homoafetivo tem amparo infraconstitucional desde 1996 – lei do planejamento familiar. Nesse sentido, a Constituição da República possui em seu fundamento o respeito à dignidade humana, a não discriminação por conta da orientação sexual, logo, homossexuais possuem embasamento jurídico infra e constitucional que fundamentam o direito a uma vida feliz, digna e sem discriminação na formulação do seu projeto familiar.
A visão ultrapassada de procriação baseada na relação heterossexual (no coito) não faz sentido, haja vista as configurações familiares a partir da adoção, da socioafetividade, das tecnologias reprodutivas. Registra-se que ambos os institutos são desatrelados da prática sexual. Dessa forma, os referidos modelos familiares estão à disposição dos casais homossexuais (não somente) para a efetivação do direito a felicidade na realização do projeto familiar.
O discurso de “sobrevivência da espécie humana” que tem como fundamento a procriação – na prática heterossexual – não se sustenta como argumento moral válido na atualidade, já que estamos diante de diversos modelos das famílias constitucionalizadas que podem constituir um núcleo sem a observância da prática sexual.
Por fim, nos cabe reafirmar as novas ordens emergentes de parentalidade e filiação com base no afeto, pois, a proteção, a responsabilidade e o amor não advém, prioritariamente, do sangue, mas dos laços afetivos que se constroem com a vivência diária, nesse sentido, se torna inconcebível a proliferação da discursiva obsoleta, preconceituosa e discriminatória baseada na identidade sexual. Portanto, exige-se: RESPEITEM TODAS AS FAMÍLIAS!
Charles Brasil, advogado e professor; Presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Acre.